Lei de estágio causa queda em número de vagas

Ambigüidades da nova legislação, em vigor há 45 dias, foram reconhecidas pelo próprio Ministério do Trabalho


Em 45 dias, desde que a nova lei de estágio foi sancionada pelo
presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o número de vagas oferecidas no País caiu 40%, de acordo com levantamento da Associação Brasileira de Estágios (Abres). A oferta caiu de 55 mil postos mensais para 33 mil. O motivo, segundo a entidade, é o desconhecimento das novas regras, que têm assustado e confundido as empresas e as instituições de ensino superior. Apenas o Centro de Integração Empresa-Escola (Ciee) já fez
cerca de 30 mil atendimentos para solucionar dúvidas de empresários, instituições de ensino e estudantes.

Além disso, a burocracia exigida para adaptar contratos e modificar as propostas pedagógicas dos cursos torna o processo ainda mais lento. “Acreditamos que levará cerca de dois anos para que a situação se normalize e a oferta volte ao normal”, afirma Seme Arone Júnior, presidente da Abres. “Isso porque as faculdades não se prepararam e as empresas estão com medo. Há muita falta de informação”, diz ele. Arone Júnior, no entanto, acredita que a lei, apesar da confusão inicial, será benéfica para os estagiários, que terão mais garantias de respeito ao seu desenvolvimento educacional.

Um dos pontos da lei que provocaram confusão e empacaram os estágios foi a determinação de que os estágios não obrigatórios constem do projeto pedagógico dos cursos de graduação – até então, isso não era requisito. Desse modo, se a instituição ainda não atualizou seu projeto – e em algumas isso é um processo demorado, que depende de votação em conselhos universitários, por exemplo -, ela não poderá assinar ou
renovar o contrato de estágio do aluno.

Outros pontos polêmicos são a jornada diária da atividade (de 8 para 6 horas semanais), o tempo de permanência no mesmo estágio (restrito a dois anos) e os benefícios obrigatórios. O secretário de Políticas Públicas de Emprego do Ministério do Trabalho, Ezequiel Sousa do Nascimento, afirma que a pasta pretende publicar uma instrução normativa para dirimir as dúvidas
em até 15 dias. “Vamos nos reunir terça e quarta-feira para redigir o texto”, diz Nascimento.

Para tentar acabar com as polêmicas, o Ministério da Educação também se pronunciará oficialmente. A coordenadora de políticas públicas da Secretaria de Educação Profissional e Técnica do Ministério da Educação (MEC), Caetana Juracy Rezende Silva, que participou da elaboração da lei, diz que o MEC enviará até o fim do mês um comunicado às instituições de ensino com instruções práticas.

APLICAÇÃO
A falta de clareza de alguns artigos é mencionada mesmo por quem defende a nova lei. Coordenadora dos estágios do curso de Enfermagem do Centro Universitário São Camilo, em São Paulo, Taís Fortes considera a lei um avanço por dificultar a utilização do estagiário como mão-de-obra barata. Mas tem dúvidas. Ela não sabe, por exemplo, se o artigo 14, que afirma se aplicar “ao estágio a legislação relacionada à saúde e segurança no trabalho”, implica a exigência de exames médicos
admissionais e demissionais.

Caetana explica que a intenção desse artigo não era exigir esses exames, mas garantir aos estagiários os instrumentos e procedimentos de segurança utilizados pelos funcionários da empresa. A gerente jurídica e de desenvolvimento de projetos sociais do Ciee, Maria Nilce Mota, comemora a interpretação de
Caetana, mas afirma que, até a publicação da instrução normativa, a entidade vai recomendar às empresas, de forma preventiva, a realização dos exames. Maria Nilce considera que a diminuição na oferta de vagas é apenas temporária e só vai durar até as empresas e instituições fazerem os ajustes.

O assessor jurídico do Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior no Estado de São Paulo (Semesp), José Roberto Covac, afirma que a lei mais atrapalha do
que ajuda os estagiários. Ele argumenta que a nova lei engessa as
relações entre estudante, escola e empresa. “Alguns estágios tornam-se inviáveis com a carga horária de seis horas e o período máximo de dois anos na mesma empresa.” Ele afirma que não seria necessário criar uma nova lei: bastaria fiscalizar as condições de atividade dos estagiários.

Caetana entende que, no início, a lei pode dar a impressão de que prejudica o estagiário. “Afinal, alguns se submetem a um estágio precário porque precisam da remuneração”, aponta. “Mas, depois, é fácil compreender que todos são beneficiados quando não se reforça a precarização das condições de trabalho.”

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