Após um mês em vigor, lei de estágio faz com que 60 mil sejam dispensados

Após um mês em vigor, a nova lei de estágio (Lei 11.788/08) já mostra
suas conseqüências: 60 mil estudantes foram dispensados. As empresas e
instituições de ensino ainda não se adaptaram às regras e houve uma
diminuição de 40% no número de vagas oferecidas em outubro, na
comparação com setembro, segundo pesquisa da Abres (Associação
Brasileira de Estágios).

“A lei entrou em vigor e as empresas pararam para entendê-la. Chamaram
advogados, conselheiros. Ela gerou medo, pois o texto diz que, se a
empresa não cumprir as regras, acabará caracterizando vínculo
empregatício, com todos os direitos previstos na CLT”, explica o
presidente do Nube (Núcleo Brasileiro de Estágios), Carlos Henrique
Mencaci.

Receio de errar

José Carlos Rodrigues, sócio-diretor da System Plus, empresa
especializada na terceirização de operações burocráticas do
departamento de Recursos Humanos, concorda que o empresariado está
repensando as contratações de estagiários por medo de errar.

“E ainda fiquei sabendo recentemente, por meio de relatos de empresas,
que a fiscalização já está saindo às ruas para verificar a aplicação
das
regras nos novos contratos”.
“Ainda é cedo para retomarmos a quantidade de oportunidades oferecidas
antes da lei, mas acreditamos que o mercado volte a contratar
normalmente no prazo de um ano”, afirma o presidente do Nube, em
referência ao tempo que será necessário para a absorção das burocracias
definidas pela lei.

Notícia ruim para estudantes carentes

Antes da lei, o Brasil tinha 1,1 milhão de estagiários, sendo 385 mil do
ensino médio e 715 mil do superior. Esses dados mudaram. “Levantamento
parcial mostra que hoje temos por volta de 1,040 milhão de estagiários
e o número pode ser reduzido ainda mais”, afirma o presidente da Abres,
Seme Arone Junior.

Uma notícia ruim para os 8,9 milhões de estudantes no nível médio. Na
opinião de Mencaci, do Nube, essa contração será ainda maior devido à
cota estabelecida pelo artigo 17 da lei para esses estudantes. “Houve
limitação justamente para os alunos com mais necessidade de uma
primeira chance no mercado de trabalho”, diz ele.

Mesmo para quem consegue uma oportunidade de estágio, precisa enfrentar
outro problema: ter o contrato assinado pela instituição de ensino onde
estuda. O procedimento está sendo dificultado, ou por falta da previsão
do estágio não-obrigatório no projeto pedagógico do curso ou por conta
de implicações jurídicas da própria instituição.

Universidades também são barreira

Mencaci lamenta a barreira que está sendo imposta pelas próprias
instituições de ensino. “As escolas também deram uma parada na
assinatura dos contratos. Um dos problemas é que, agora, o projeto
pedagógico precisa prever o estágio não-obrigatório e, para alterá-lo,
é necessária a aprovação do Conselho de Educação ou outro conselho
responsável”. E o processo pode ser demorado.

Ele cita como exemplo uma grande instituição que não está assinando os
contratos que prevêem seis horas de trabalho e uma hora adicional de
almoço para os estagiários. Segundo a instituição, o almoço deveria
estar incluído nas seis horas, o que, segundo o presidente do Nube, não
é verdade.

“A lei está gerando confusão nas universidades, mas acredito que, dentro de alguns meses, haverá um entendimento geral”, afirma.

Para Rodrigues, da System Plus, as universidades e as escolas não estão
fazendo sua parte. “Elas precisam definir o programa de estágio nos
projetos pedagógicos dos cursos, para que as empresas possam seguir o
programa desenhado por elas”.

Dúvidas freqüentes

Entre as dúvidas mais freqüentes das empresas, relatadas pelo Nube e pelo sócio-diretor da System Plus estão:

*Quem já estagiava na empresa há algum tempo e terá o contrato renovado agora, com base na nova lei, terá direito ao recesso?

*Se a empresa interromper o contrato antes de o estagiário completar um
ano na empresa, ele terá de ser indenizado pelo período de recesso a
que
tem direito

*Quem ganhava por hora e trabalhava oito horas por dia, poderá ter a
remuneração reduzida, já que, pela nova lei, estagiários não podem
trabalhar mais de seis horas por dia? E como fica a questão da retenção
de talentos? Esses estagiários não se sentirão desmotivados?

*A lei diz que o estudante não pode estagiar mais de dois anos na mesma
empresa. Mas e quem já estava estagiando há dois anos antes da lei ser
sancionada? Poderá ter o contrato de estágio renovado?

Na opinião de Rodrigues, o governo ainda precisa regulamentar a lei para
sanar todas essas dúvidas. “A legislação precisa ser complementada”,
avalia.

Mencaci, por sua vez, lembra o quanto a operacionalização das seis
horas tem atrapalhado as empresas. “Algumas organizações estão
localizadas em pontos muito distantes, de maneira que oferecem fretado
a todos os funcionários. Mas agora, com a redução do horário de
trabalho para seis horas, surge a dúvida: “como viabilizar um fretado
para alguns funcionários às 15h da tarde?”.

Para
Mencaci, a nova lei tem o mérito de aumentar a qualidade dos estágios,
mas também de diminuir sua quantidade. “Estamos mostrando às empresas o
lado bom da regra, que é o aumento da segurança jurídica”, diz.

Crise

O pior de tudo isso é que a expectativa do Nube é de mais queda das
contratações em novembro, por conta da crise financeira global. Como
pesquisas já mostram, diversos segmentos já têm contração no nível de
emprego e os estagiários não estão imunes aos problemas da economia
brasileira.

De acordo com pesquisa da Ricardo Xavier Recursos Humanos, pela primeira
vez este ano, o mercado de trabalho como um todo teve uma queda no
número de vagas abertas: foram 8,26% menos postos em outubro, contra o
mês anterior, quando havia sido registrado um crescimento de 6,63% ante
agosto.

Segundo o presidente da Ricardo Xavier, Hélio Terra, a pequena queda
decorre principalmente da influência da crise nas empresas de capital
internacional, que já estão revendo seus investimentos.

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